Os muros de nossas casas estão se tornando cada vez mais altos; as grades, cada dia mais fechadas e agressivas, de modo a afastar, decididamente, qualquer que ali não viva. Apenas reflexos do que trazemos dentro de nós: a angústia, o medo, a insegurança.
Tais sentimentos isolam o indivíduo, separam as pessoas, reduzem o convívio com os próprios humanos vizinhos que, quase sempre, já não os conhecemos mais. E, desse modo, nos tornamos prisioneiros de nós mesmos. Em nome da segurança. Mas também, em nome do desinteresse pelo outro, gerado por aquele afastamento.
Na proporção em que crescem os muros de nossas casas, cresce também nosso desinteresse pelos demais e, assim, de modo progressivo e constante, vai minguando nossa capacidade de interagir, de trocar, de crescer junto, impulsionados que seríamos pelos frutos da convivência que já não colhemos. Ficamos mais pobres como humanos porque a força da natureza grupal de nossa espécie é reprimida pelas circunstâncias que nós mesmos criamos.
A insegurança, assim como o medo, geram angústia e ansiedade. Como resultado, nos afastamos uns dos outros, mas também de nós mesmos. Quando temos medo, quando estamos inseguros, nós nos distanciamos de nossa própria natureza, daquilo que somos e de tudo em que acreditamos, porque passamos, então, a priorizar apenas a sobrevivência. Deixamos de querer saber do outro, de seus interesses e de suas necessidades.
Esse comportamento já toma conta de quase toda a sociedade humana e, geralmente, não nos apercebemos da profundidade com que, de muito, já se instalou entre nós. Expressões como “eu já fiz a minha parte” ou “isso não é problema meu”, não necessariamente resultam de uma personalidade egoísta, mas transformada e conduzida por aqueles sentimentos que se originaram do medo.
O contraponto para essa situação é a boa vontade.
A boa vontade, portanto, escasseia onde medra o medo.O mundo, hoje, talvez necessite, mesmo, muito mais dessa postura positiva nos pequenos acontecimentos do dia-a-dia do que de grandes e anunciadas ações altruísticas. Não que se prescinda dessas últimas, mas porque parece ser da natureza das relações humanas essa presença de uma expectativa complementar, construtiva, essa ação do comportamento do outro, que sela ou que fortalece os contatos mais superficiais, e que referenda e confirma as amizades mais profundas.
Trata-se, antes de tudo, de uma virtude simples, de ambiente simples, cujo habitat mais comum são os acontecimentos diários e corriqueiros da vida, mas que também pode se manifestar, com igual desenvoltura, nas situações mais drásticas e significativas da existência humana.
É bem-vinda em qualquer ambiente, de qualquer nível, porque disponibiliza para o outro um auxílio ou, pelo menos, uma facilidade. Qualquer de nós prefere estar com pessoas de boa vontade, seja em casa, no trabalho, no esporte, no comércio, enfim, em qualquer situação e lugar, sempre nos sentimos bem melhor quando somos abordados ou atendidos por pessoas com essa característica.
A boa vontade pode se propagar com intensidade, sempre, e cada vez maior, por aqueles que tomam a iniciativa de desenvolvê-la em si mesmos. Resta-nos, portanto, a iniciativa do primeiro passo, assumindo, conscientemente, que este é um valor e um traço da personalidade humana que precisa ser desenvolvido, se, porventura, ainda não o foi, e multiplicado, se já. Precisa mesmo ser estimulado, porque diminui o medo e recupera a convivência perdida.
Boa vontade: a chave que abre todas as portas.
(extraído do livro É SIMPLES DESSE JEITO!)